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Michelet define a Revolução como "o advento da Lei, a ressurreição do Direito, a reação da Justiça" Ele discute em seguida o dogma da salvação pela Graça, que é, para ele, a própria negação da Justiça, pois, "se permanecermos fiéis ao princípio de que a salvação é um dom, e não o pagamento da Justiça, o homem cruza os braços, senta e aguarda; sabe que suas obras não podem fazer nada por sua sorte. Toda atividade moral cessa nesse mundo".
Como não há Justiça, o Julgamento não passa de uma comédia que se encena nas Igrejas. "A criança, o inocente, criados voluntariamente para o inferno!". Ao ver a criança condenada, "essa chaga profunda, espantosa, no coração materno", escapa o primeiro suspiro do homem medieval, o primeiro "Mas", um suspiro tão baixo...
"Tão baixo, mas tão destruidor!... O homem que o escutava na noite não dormia mais essa noite... e nem outras... E na madrugada, antes do dia, ia aos campos trabalhados; e então encontrava ali as coisas mudadas. Encontrava o vale e a planície mais baixos, bem mais baixos, profundos como um sepulcro; e mais altas, mais sombrias, mais pesadas, as duas torres no horizonte, sombrio o campanário da igreja, sombrio o torreão feudal... E começava também a compreender a voz dos dois sinos. A igreja soava: Sempre. O torreão soava: Nunca... Mas ao mesmo tempo, uma voz falava mais alto em seu coração... Essa voz dizia: Um dia!... E essa era a voz de Deus!
Um dia virá a justiça! Deixe aí esses sinos vãos, tagarelando com o vento... Não se alarme por sua dúvida. Essa dúvida é a fé mesma. Creia, espere; o Direito adiado terá seu advento, virá ocupar, julgar, o dogma e o mundo... E esse dia do Julgamento se chamará a Revolução."
MICHELET, Jules. Histoire de la Révolution Française. t.1. v.1. Paris: Gallimard, 2007. [1ª ed. 1847-1853]. (Folio Histoire). pp. 21, 28, 32 e 33. (Tradução minha).
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