
Nas mulheres grávidas, qualquer coisa, por exemplo, o modo de caminhar, influi no parto: se ingerem alimentos muito salgados, põem no mundo uma criança sem unhas; se não sabem prender a respiração, têm mais dificuldades para dar à luz; até um bocejo, durante o parto, pode ser letal; bem como um espirro durante o coito pode provocar um aborto. Compaixão e vergonha dominam quem pensa no quanto é precária a origem do mais soberbo dos seres vivos: freqüentemente, para abortar basta o cheiro de uma lâmpada que se apagou. E dizer que de um início tão frágil pode nascer um tirano ou um carrasco! Você que confia em sua força física, que aperta nos braços os dons da fortuna e se considera não um pupilo mas um filho dela, você que possui ânimo dominador, você a quem apenas um êxito faz inchar o peito e já se acredita deus, imagine que tão pouco poderia destruí-lo.
Plínio, o Velho (23-79 d.C.).
História natural, VII, 42-4. In: Ítalo CALVINO.
Por que ler os clássicos. São Paulo: Cia das Letras, 2007.
Acho esse trecho do Plínio particularmente genial, porque mostra uma idéia de medicina que parece cômica ao olhar atual ("um espirro durante o coito pode provocar um aborto") e logo depois impõe uma primazia do ensinamento moral.
Vou postar como comentário um trecho do Ítalo Calvino sobre o Plínio. Vale a pena.
3 comentários:
[...] Plínio partilha a opinião de que após a morte se inicie uma não-existência equivalente e simétrica àquela que precede o nascimento.
É por isso que a atenção de Plínio se projeta sobre as coisas do mundo, corpos celestes e territórios do globo, animais, plantas e pedras. A alma, à qual toda existência é negada, se se dobra sobre si mesma, só pode fruir a existência no presente. [...] "Modelar a própria tranquilidade sobre a experiência anterior ao nascimento": ou seja, projetar-se na própria essência, única realidade segura antes de virmos ao mundo e depois da qual estaremos mortos. Eis então a felicidade de reconhecer a infinita variedade do outro em nós próprios que a Naturalis historia projeta diante de nossos olhos.
Ítalo Calvino. Por que ler os clássicos.
É isso aí. O livro que eu li do Plínio não era esse, era o volume de Cosmologia, mas optei por esse porque é muito bom.
Abraços.
Sensacional ...
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